Têm-me dito para esquecer,
para passar à frente,
para fingir que nada existiu...
Têm-me dito para seguir caminho,
que tudo já passou,
e que tenho mais é que viver...
Têm sugerido que "encravei" na doença
que não a ultrapasso,
que tenho que esquecer....
Será que alguma vez
alguém se perguntou
se é possível esquecermos
algo tão profundo na nossa Vida?
Será que, porventura,
alguém se apercebeu que não passou,
que ainda não passou...
Que tenho que encarar consultas,
e médicos e um corpo transformado,
todos os dias?
Será possível apagar
as cicatrizes da alma,
quando as do corpo
permanecem intactas e perenes?
Quando uma espada
permanece suspensa sobre nossas cabeças?
Eu vivo a realidade da Vida.
O dia-a-dia, o minuto a minuto.
Mas, recordo sempre, que este minuto
que agora passa,
é a única certeza que tenho na minha Vida...
Por isso, não me peçam para esquecer...
Não se pede a um soldado que volta da guerra,
para esquecer, embora por vezes ele o fizesse,
se lho fosse permitido.
Se fosse possível eu aliviar o sofrimento
daqueles que encontro todos os dias,
dos que fazem tratamento dolorosos,
dos que permanecem presos a camas de hospital,
dos que já não têm esperança,
dos que estão esquecidos e depauperados...
Se meu esquecimento
permitisse dar-lhes nova vida,
esqueceria tudo...
No entanto, cabe a nós,
aqueles que vão sobrevivendo,
não permitir que o mundo
esconda a cabeça debaixo da areia,
para não ver o que é feio...
Cabe a nós lembrar
que existem guerras a ser travadas,
pessoas que precisam de voz,
para que elas não sejam um mundo áparte.
Por isso, não me peçam que esqueça.
Não me peçam que não fale do assunto,
que ponha tudo p'ra trás das costas
e que viva como se nada tivesse acontecido!
Sou um soldado, que continua em batalha,
que traz consigo marcas de guerra,
e que dará sempre voz
aos que o sofrimento e a doença emudeceu.
Olá Anabela,
ResponderEliminarSe há mais alguém, além de mim, que te tem pedido para ultrapassar, então essa pessoa tem todo o meu apreço!
Não se trata de esquecer! Esquecer só se fosses vitima de um ataque de amnésia... Esquecer, não se esquece. Ultrapassa-se, não se fica preso a... Segue-se em frente, liberta-se. Não faças da tua vida uma missão tão pesada! Continua amiga dos teus amigos, apoia-os, visita-os, mas não vivas para esse fim... É triste, é pesado.
As tais "marcas de guerra" de que falas são tratáveis por meio da medicina, da cirurgia,sabes muito bem disso! As marcas psicológicas só se agravam se continuares indefinidamente a viver no meio da doença, a falar sobre doença, a respirar doença...
Gosto muito de ti! Ficaria muito feliz se te visse mais aberta para as coisas bonitas da vida, e menos preocupada com dar voz ao sofrimento.
Todos nós temos uma espada qualquer sob a nossa cabeça, não só os doentes oncológicos. Nenhum de nós vai viver para sempre, ou tem a certeza de ser saudável para sempre. Quantos de nós não poderão até estar doentes neste momento,sem saber sequer? Faz parte da nossa condição de viventes e de mortais. Fazer o quê?
De que serve ao soldado voltar da guerra, se o seu espírito não encontrar a paz? É até uma injustiça para os camaradas que tombaram.
O teu poema está muito bonito como sempre! Desculpa o "sermão". Gosto muito de ti!
Beijinhos,
Glória
olá querida Anabela,
ResponderEliminarParabéns pelos lindos textos. Falar sobre a doença e sobre o que te vai na alma, por enquanto, é o caminho certo.
Para evoluirmos não podemos esquecer das provas passadas. Ninguém enfrenta os problemas da mesma maneira, pessoalmente não acho que fazer de conta que esta tudo bem, que não aconteceu nada, que é tudo passado, não é a melhor maneira. Ultrapassar, tu já o fizeste e posso dizer que és um exemplo de força e coragem para muita gente. Espero que nunca mudes!
Beijinhos,
Cristina